domingo, 7 de julho de 2013

MÉDICOS DIZEM NÃO A PADILHA

MÉDICOS DIZEM NÃO A PADILHA
                           
Autor - Alvaro L. S. Jesus

Desconfio quando vejo escravizados defendendo seus senhores, estupradas defendendo seus estupradores. Quando a senzala se alia a casa grande. Quando a oposição se cala diante dos desmandos da situação. Eu sou médico, não posso defender quem quer esmagar a categoria profissional a qual pertenço. Mesmo que eu pertença ao mesmo partido do ministro carrasco, discordo dele. Neste caso tenho também que alertar o partido e, entrando no debate, provocar a reflexão. Se não for entendido, paciência.
O titular da Pasta da Saúde, ministro Alexandre Padilha, anunciou e induziu a presidente a cometer um grave erro: jogar o anzol para pescar médicos cubanos, portugueses e espanhóis para vir trabalhar na periferia das cidades brasileiras, de preferência as mais pobres e distantes, justificando-se com bases em falsas premissas: faltam médicos no Brasil. Não faltam médicos, não. Faltam as condições dignas de trabalho – garantias: trabalhista, salarial, estrutural, segurança, continuidade na formação profissional (educação), acessibilidade, diminuição da carga tributária.
Não é verdade que faltam médicos no Brasil. O que há é uma  má distribuição dos médicos que estão mais concentrados nas grandes cidades, notadamente nas capitais dos estados das regiões sul e sudoeste. Nas capitais de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, dentre outras, as condições de infra-estrutura e as condições de trabalho são mais condizentes com o exercício da profissão e com a atualização  profissional.  Ademais, as prefeituras impõem aos médicos e demais profissionais de saúde, condições profissionais quase escravizantes – sem férias, sem FGTS, sem direito a licença médica, sem 13º. salário – sem contrato de trabalho. Os patrões não são conhecidos. Entre as prefeituras e os médicos postam-se os intermediários (ONGs, OSCIPs, Fundações, Cooperativas...) cujos representantes nunca dão as caras, mesmo porque geralmente moram em outros estados, não tem endereços nem número de telefone conhecidos.
Não é que a categoria médica seja contra a entrada de colegas de outra nacionalidade pelas vias normais, desde que revalidando seus diplomas, submetendo-se as leis vigentes no país, vindo individualmente como sempre foi. Não somos contra o intercâmbio profissional. Somos contra a importação em massa como política de governo baseada em premissas que não se sustentam. Somos contra a vinda de navios e aviões cargueiros cheios de médicos sem passar pela alfândega. Mesmo por que, assim é contrabando. Somos contra quando se faz uma lei específica para importar uma fornada profissional por que assim é prática de exceção que exige apreciação do judiciário. Não, assim não, ministro.
Há pouco tempo os jornais impressos e televisivos nacionais noticiavam os espanhóis tratando mal os brasileiros em seus aeroportos, dificultando nossa entrada lá no seu país, engrossando a voz contra nós. Algumas vezes até foram além de engrossar a voz. Não há muito tempo os patrícios portugueses dificultaram a vida dos nossos dentistas lá em Portugal. Quem não se recorda que Cuba não deixava um só cubano deixar seu território. Lembramos que desportistas cubamos foram deportados pelo governo Brasileiro sem nenhum crime cometer - nem lá nem aqui. Parece que abriram as porteiras agora. Anistiaram todos num piscar de olhos. Em nome de uma política eleitoreira o ministro vai liderar um pelotão de jaleco branco. Ou então o ministro quer reviver Pedro Álvares Cabral ou Cristóvão Colombo comandando caravelas de lá para cá. Ministro, com essa provocação, o senhor pode estar fabricando algum Che Guevara - E endurecer é preciso, mas sem perder a ternura jamais. Os médicos podem praticar a reconvenção.
O PT tem nos médicos uma categoria profissional que mais engrossou e engrossa suas fileiras – quer como simpatizantes da causa, quer como filiados, quer como eleitos para cargos no executivo ou no legislativo. Ademais, os Sindicatos de Médicos nos estados, quase todos, rezam nas cartilhas e são controlados pelo PT, pelo PCdoB e pelo PSB. E o Ministro da Saúde se postou como bucha de canhão do “fogo amigo” contra seus “colegas de profissão”- (antes de ser ministro ele era médico) e uma boa parte companheiros de luta.
Estranho também é a inflexão radical autoritária do PT - de um partido que construía suas decisões de forma descentralizada e periférica passou a impor seus atos de modo imperialista e centralizado, elitizado e imperial. Não mais discute com as bases partidárias tão valorizadas no passado. Não mais ouve as vozes do campo, das fábricas e das universidades. Não consulta mais as categorias profissionais. Dita as ordens e reúne-se com os prefeitos (de todos e de quaisquer partidos) para avisar a decisão e planejar a implantação dos seus planos ditatoriais. E seus projetos são sempre forjados por marqueteiros que colhem as idéias em árvores dos institutos de pesquisas (apontavam a saúde como o problema que mais afligia o povo brasileiro - 70%). Então, quem pauta a política de saúde é João Santana não é o Alexandre Padilha. Sendo assim, já há motivos para demitir o ministro; e seu substituto não precisa ser procurado. Mas, números não falam por si só. O homem precisa refletir sobre os números. E o governo precisa investir em infra-estrutura e fazer a gestão correta.  Só político em campanha inverte a ordem dos fatores. Estamos diante de um dolo intelectual. E o nome do erro de estratégia é piada de marqueteiro.
Ser intelectualmente cínico ou canalha não é privilégio de um homem só ou de um partido só. Demóstenes Torres (DEM) mostrou que não era flor que se cheirasse. Nathan Donadan (PMDB) está trancafiado. Collor (PTB) foi empitchado. Sobre Renan e Sarney (PMDB) pesam algumas denúncias. Sobre Azeredo e Perillo (PSDB) pesam mensalinho e também esquema Cachoeira. Sobre o PT, além da acusação em relação ao mensalão, Padilha veio agora se confrontar com um dos pilares humanos do partido, os médicos, que juntos formam uma categoria profissional que não arreda o pé da agremiação desde a sua fundação.
Moral da estória: um médico-ministro contra todos os médicos não ministros. E o médico-ministro foi quem pisou na bola! É hora de fazer a escolha. Ou o PT demite o ministro ou o ministro acaba com o PT. Um tiro no pé.
Mas a questão da guilhotina e manipulação dos profissionais da saúde não é de hoje, nem é de agora. Queriam eles tirar poder dos médicos na questão relativa ao ato médico. Tentaram rolar a maçã podre e envenenada entre os profissionais da saúde para se digladiarem. Alguns entraram no jogo. A guerra parecia não ter fim. O salário dos enfermeiros despencou. Dos dentistas despencou. Dos fisioterapeutas despencou. E eles achavam que deveriam tirar a diferença subtraindo poder profissional dos médicos. Não entenderem que a política de saúde incentivava a queda do salário, a competição desleal e desmedida para atirar proveito disso.  O enfermeiro é hoje, no Programa de Saúde da Família, um funcionário burocrático que ganha o salário de um Técnico em Enfermagem para não exercer a sua função de... Enfermeiro, com a grade curricular de... Enfermeiro. Sua função imposta pelo Ministério da Saúde é de “técnico em estatística” – faz coleta de dados – são mais de 30 (trinta) formulários que o Enfermeiro tem que manusear para preencher diariamente e ainda no final do mês fazer a totalização dos dados para que as instâncias de governo possam exibir suas proezas. Mas os Enfermeiros querem culpar os médicos pelos insucessos dos equívocos de seus sindicatos que não se ocupam em defender integralmente e com o foco correto os... Enfermeiros. Os sindicatos dos profissionais na área de saúde caíram no conto da maça rolada criminosamente entre eles. A maçã podre e envenenada.

Tudo tem um fim. Este texto também. A questão é longa e complexa. Sei que estou ferindo muitas sensibilidades. Nada posso fazer. Sou médico. Tenho filiação partidária. Defendo minha cidadania. Estou sujeito a críticas. Tenho o direito de criticar. Esta é a minha primavera. Aponto equívocos. Não quebro vidraças nem jogo pedras em policiais.

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